JUÍZO DE RETRATAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL: ESTRATÉGIAS DE ATUAÇÃO NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

O juízo de retratação em agravo regimental é um mecanismo de grande relevância no contexto do processo judicial brasileiro, especialmente nos tribunais superiores, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF). Este instituto confere ao relator de um agravo regimental a possibilidade de reconsiderar sua decisão monocrática antes de submetê-la à apreciação de um órgão colegiado, como turma, seção ou plenário do tribunal. Trata-se de uma medida essencial para garantir eficiência e celeridade na prestação jurisdicional, permitindo a correção imediata de eventuais erros materiais, omissões ou interpretações equivocadas da lei, evitando que o processo seja encaminhado indevidamente para deliberação colegiada, o que implicaria desperdício de recursos e tempo.

BASES LEGISLATIVAS E FUNDAMENTAÇÃO NORMATIVA

A previsão normativa do agravo regimental encontra-se estabelecida nos regimentos internos dos tribunais superiores. No caso do STJ, o agravo regimental é disciplinado pelo art. 258 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ), o qual dispõe sobre a competência do órgão colegiado para conhecer e julgar este recurso. O dispositivo destaca que o agravo regimental pode ser interposto sempre que a decisão do relator causar prejuízo a uma das partes, permitindo que a matéria seja apreciada pela turma, seção ou pelo plenário, conforme a competência regimental. Em complemento, o regimento especifica que o agravo não cabe contra decisões do relator que derem provimento a agravo de instrumento, determinando a subida de recurso especial não admitido.

Já no âmbito do STF, o agravo regimental é regulamentado pelo art. 317 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF), que estabelece que tal recurso não possui efeito suspensivo e pode ser manejado contra decisões monocráticas que neguem seguimento aos recursos. O texto regimental é claro ao afirmar que o agravo seguirá o procedimento ordinário de análise previsto para decisões monocráticas, devendo ser avaliado em conformidade com os critérios de admissibilidade e mérito estabelecidos pelo tribunal.

É importante destacar que, embora o Código de Processo Civil (CPC) não contenha uma previsão expressa acerca do agravo regimental, ele menciona, em seu art. 1.021, a possibilidade de interposição de agravo interno contra decisões monocráticas de relatores, o que, na prática, é assimilado ao agravo regimental no âmbito dos tribunais superiores. O Código de Processo Penal (CPP), por sua vez, é omisso quanto a qualquer menção específica ao agravo regimental ou interno, o que não impede sua utilização, desde que respaldada pelos regimentos internos das cortes superiores.

OBJETIVOS E FINALIDADES DO AGRAVO REGIMENTAL

O agravo regimental desempenha funções essenciais na dinâmica processual dos tribunais superiores. Entre os seus principais objetivos, destacam-se:

  1. Revisão de Decisões Monocráticas: O agravo regimental visa, primordialmente, possibilitar a revisão de decisões que foram tomadas de forma individual por um relator, sem que tenham passado pela deliberação de um órgão colegiado. Este recurso permite que tais decisões sejam submetidas à análise de um grupo de magistrados (turma, câmara ou seção), assegurando uma revisão mais aprofundada, democrática e plural das matérias, garantindo maior transparência e legitimidade ao processo decisório.
  2. Correção de Eventuais Erros ou Injustiças: Outra função importante do agravo regimental é a correção de erros materiais, omissões, contradições ou má aplicação da lei que possam ter ocorrido na decisão monocrática. O recurso abre a possibilidade para que o relator, ao exercer o juízo de retratação, ou o colegiado, ao julgar o agravo, possa corrigir equívocos, evitando injustiças e garantindo que a decisão final esteja em conformidade com o ordenamento jurídico, os princípios constitucionais e a jurisprudência dominante.
  3. Assegurar o Direito ao Contraditório e à Ampla Defesa: O agravo regimental também é um importante instrumento de proteção dos direitos fundamentais das partes, especialmente no que tange ao contraditório e à ampla defesa. Ao permitir a revisão de uma decisão monocrática, o recurso garante que todas as alegações e provas apresentadas pelas partes sejam devidamente consideradas por um órgão colegiado, assegurando que a decisão seja proferida de maneira justa e equilibrada.
  4. Prevenção de Recursos para Instâncias Superiores: Ao facultar a revisão de decisões ainda no âmbito do próprio tribunal, o agravo regimental evita a interposição de outros recursos para instâncias superiores, promovendo a celeridade e a economia processual. Esse recurso, portanto, contribui para evitar o acúmulo de processos nos tribunais superiores, racionalizando o trabalho judiciário e aumentando a eficiência da prestação jurisdicional.

TRÂMITE DO AGRAVO REGIMENTAL NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

O trâmite do agravo regimental varia de acordo com o tribunal e a natureza da decisão que se pretende impugnar. No STJ, o agravo regimental é geralmente julgado pela Turma ou pela Seção a que pertence o relator da decisão monocrática. Quando o agravo é interposto contra decisões que negam seguimento a recurso especial ou agravo em recurso especial, ele é julgado pela Turma correspondente. Em situações mais complexas, que envolvem questões de competência interna ou matérias de maior relevância, o julgamento poderá ser realizado pela Seção ou até mesmo pelo Plenário do tribunal.

No STF, o agravo regimental segue procedimento semelhante. Em geral, é julgado pela Turma, especialmente quando se trata de decisões monocráticas proferidas no âmbito de recursos extraordinários ou ações originárias de menor repercussão. No entanto, para temas de grande relevância ou repercussão geral, o agravo pode ser submetido diretamente ao Plenário, onde todos os ministros do STF participam do julgamento.

JUÍZO DE RETRATAÇÃO: DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA

O juízo de retratação é um aspecto fundamental do agravo regimental, configurando-se como o poder conferido ao relator para reconsiderar sua própria decisão monocrática antes que ela seja submetida ao julgamento do órgão colegiado. Este mecanismo permite que o relator reveja e, se necessário, modifique sua decisão à luz de novos argumentos apresentados pela parte agravante ou de eventuais erros identificados no ato decisório original.

A importância do juízo de retratação reside em sua capacidade de promover a correção imediata de erros materiais, omissões ou interpretações equivocadas da lei, sem a necessidade de sobrecarregar o colegiado com questões que poderiam ser resolvidas de forma célere pelo próprio relator. Esta prática assegura uma economia processual significativa, reduzindo o tempo e os recursos gastos em julgamentos desnecessários, e concentrando os esforços do tribunal em questões que realmente demandam uma deliberação colegiada.

Ademais, o juízo de retratação contribui para a celeridade processual, ao permitir que o relator corrija possíveis equívocos imediatamente, evitando o prolongamento indevido do processo e assegurando uma resposta mais rápida e eficaz às partes envolvidas. Em última análise, o juízo de retratação reforça o princípio da eficiência, promovendo uma justiça mais célere, justa e transparente.

CASOS PRÁTICOS DE JUÍZO DE RETRATAÇÃO E AGRAVO REGIMENTAL

O uso do agravo regimental e do juízo de retratação pode ser ilustrado por casos práticos que demonstram sua relevância e eficácia. No julgamento do Habeas Corpus nº 865422 pelo STJ, por exemplo, a defesa do agravante pleiteou o redimensionamento da pena-base, afastamento da reincidência e exclusão das qualificadoras, com base na Súmula 241 do STJ. O relator, em decisão monocrática, indeferiu liminarmente o Habeas Corpus, alegando que o recurso havia sido impetrado contra um acórdão já transitado em julgado, o que configuraria uso indevido do Habeas Corpus como substitutivo de revisão criminal.

No entanto, a defesa argumentou que não houve trânsito em julgado do acórdão em relação ao agravante, uma vez que recursos ainda estavam pendentes de julgamento. Além disso, destacou-se a existência de flagrante ilegalidade na dosimetria da pena, uma vez que a mesma condenação foi usada tanto como circunstância judicial negativa quanto como agravante de reincidência, configurando “bis in idem” em violação à Súmula 241 do STJ.

Além desse caso, tem-se o AgRg em HC nº 894454, o qual trata de paciente que impetrou HC contra decisão que negou seguimento ao HC impetrado contra sentença condenatória que, mesmo ao reconhecer a menor participação do indivíduo e aplicar a fração de diminuição de pena, não permitiu que recorresse em liberdade sob fundamento no perigo da conduta dos demais corréus.

O primeiro HC impetrado no TJCE teve como fundamento a notória antecipação de pena do paciente, haja vista que a sentença não considerou os fatos novos – reconhecimento da menor participação – para avaliar a necessidade de manutenção da prisão preventiva, impedindo-o de recorrer em liberdade.

O segundo HC, impetrado já no STJ, explicou sobre a ausência de fundamentação da decisão que negou a liberdade provisória do paciente, se limitando a descrever a conduta dos demais corréus e ignorando por completo o princípio da individualização da pena. Argumento de ausência de fundamentação idônea e contemporânea para a manutenção da prisão preventiva. Em decisão monocrática, o Relator Rogério Schietti Cruz negou seguimento ao HC sob fundamento no art. 210 do RISTJ, SEM reconhecer a menor importância destacada na sentença condenatória de 1º grau

Todavia, após Agravo Regimental contra tal decisão monocrática, com o pleito de remessa para decisão colegiada ou retratação do Ministro, este proferiu nova decisão em juízo de retratação. Vejamos:

Tem razão a defesa. Embora a gravidade concreta dos crimes evidencie a periculosidade social de seus autores, em relação ao sentenciado, uma vez declarada sua participação diferenciada nos fatos (ele não participou da execução dos roubos), é suficiente a substituição da medida extrema por outras menos severas (art. 282 c/c o art. 319 do CPP), igualmente suficientes para evitar a reiteração delitiva.

Desa forma, concedeu a liberdade provisória do agravante por reconhecer veracidade nos argumentos da defesa.

Essas situações evidenciam a importância do juízo de retratação, permitindo que o relator reconsiderasse sua decisão à luz dos novos argumentos e elementos trazidos pela defesa, promovendo uma correção célere e eficiente, evitando o desgaste desnecessário de recursos judiciais e garantindo uma decisão justa e conforme aos parâmetros legais estabelecidos.

Dessa forma, o agravo regimental, junto com o juízo de retratação, desempenha um papel crucial na dinâmica dos tribunais superiores, permitindo a revisão de decisões monocráticas, a correção de erros e injustiças, e a promoção da celeridade e economia processual. Sua correta utilização é essencial para assegurar que as decisões judiciais sejam justas, transparentes e em conformidade com o ordenamento jurídico, reforçando os princípios fundamentais do contraditório, ampla defesa e devido processo legal.


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